o°o° AS FESTAS o°o°
Aproxima-se a perigosa
época das festas. O Natal e o Ano-Novo, como se sabe, despertam os melhores
sentimentos das pessoas, e isto pode ter conseqüências terríveis. São
conhecidos os casos de paixão, alguns até terminando em morte, que começaram em
festas de fim de ano, na firma, quando o espírito de conciliação e
congraçamento leva as pessoas a baixarem a guarda e aceitarem o que normalmente
não aceitariam e a fazerem o que, no resto do ano, nem pensariam, ainda mais
depois de beberem um pouco. Nada mais embaraçoso do que, no segundo dia do ano novo,
ter de tentar desfazer algum equívoco do fim do ano anterior.
— Dona Teresa, eu...
— Pintinho!
— Pinto. Meu nome é
Pinto.
— Humm. Como nós estamos
mudados, hein? Na festa...
— Era justamente sobre
isso que eu queria lhe falar dona Teresa. Na festa. Algumas coisas foram
ditas...
__Só ditas não, não é,
Pintinho?
— Pinto. Pois é. Ditas e
feitas, que...
— Já sei. Vamos fingir
que nada aconteceu.
— Eu preferiria.
— Muito bem. Só não sei o
que vou dizer ao papai.
— O que que tem o seu
pai?
— Ele está vindo de
Cachoeiro para o casamento.
Outra coisa perigosa é a
pessoa se entusiasmar no fim do ano e decidir mudar. Ser outra pessoa. Deixar
velhos vícios e adotar novas atitudes, ou recuperar algumas antigas. Janeiro,
ou pelo menos a sua primeira quinzena, é uma espécie de segunda-feira do ano.
As ruas ficam cheias de novos virtuosos, pessoas resolvidas a serem melhores do
que no ano passado.
— Olhe.
— O que é isso?
— Aquele livro que você
me emprestou.
— Eu não me lembro de...
— Faz muito tempo. E, na
verdade, você não emprestou. Eu peguei. Eu costumava fazer isso. Nunca mais vou
fazer.
— Você pode ficar com o
livro. Eu...
— Não! Ajude a me
regenerar. Quem fazia essas coisas não era eu. Era outra pessoa. Um crápula.
Decidi mudar. Este sou o eu 2006. Comecei devolvendo todos os livros que peguei
dos amigos. Acabou com a minha biblioteca, mas que diabo. Me sinto bem fazendo
isto. Outra coisa. Precisamos nos ver mais. Eu abandonei os amigos. Abandonei
os amigos! Olhe, vou à sua casa este sábado.
— Não. Ahn...
— Prometo não roubar
nada.
— Não é isso. É
que...
— Já sei. Vamos combinar
um jantarzinho lá em casa. A Santa e eu estamos ótimos. Fiz um juramento, na
noite de ano bom. Que me regeneraria. E ela me aceitou de volta. Há dois dias
que não olho para outra mulher. Dois dias inteiros! Isso era coisa do outro.
— Sim.
— Do crápula.
— Sei...
— Eu era horrível, não
era? Diz a verdade. Pode dizer. Uma das coisas que eu resolvi é não bater mais
em ninguém. Era ou não era?
— O que é isso?
— Como é que eu podia ser
tão horrível, meu Deus?
— Calma. Você está
transtornado. Vamos tomar um chopinho.
— Não! Não posso. Jurei
que não botaria mais uma gota de álcool na boca.
— Mas um chopinho...
— Está bem. Um. Em honra
da nossa amizade recuperada. E escuta...
— O quê?
— Deixa eu ficar com o
livro mais uns dias. Ainda não tive tempo de...
— Claro. Toma.
— E vamos ao chope. Lá no
alemão, onde tem mais mulher.
Rsrsrsrs...
By Luis Fernando Ver!ssimo
Obra: Orgias
Show!!!! =)
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